O polêmico tema da política de cotas raciais no acesso ao ensino superior público encontra-se sempre presente nas discussões envolvendo as ações afirmativas no Estado democrático de direito.
No entanto, algumas questões relevantes, desprendidas de quaisquer cargas emotivas e ideológicas, devem ser abordadas com mais clareza sob pena de produzirmos novas discriminações e recrudescer o preconceito, contrariando a própria essência das Affirmative Actions.
O referido debate traz à lembrança o famoso caso Bakke, levado a julgamento na Suprema Corte dos Estados Unidos em 1978 (Regents of the University of California vs. Bakke), em que afirmou ser inconstitucional o sistema de cotas, pois violava a “cláusula de igual proteção”, da 14a Emenda Constitucional, bem como a Declaração de Direitos Civis, pela qual ninguém pode ser excluído de programa ou benefício governamental por causa de sua raça ou cor.
O primeiro aspecto que merece atenção é a observância à proporcionalidade e a razoabilidade do fator de discrímen, ou seja, verificar se a reserva de vagas para determinados grupos étnicos – raciais apresenta-se de forma adequada, necessária e proporcional.
Para isso, cumpre indagar se a política de cotas raciais é adequada para fomentar o objetivo de não-discriminação no acesso de estudantes pardos, negros e indígenas. Aqui, a título de perseguir o objetivo não-discriminatório, em realidade, a norma discrimina estes estudantes, por pertencerem aos referidos grupos étnicos que concorrem em igualdade de condições, sob o critério de mérito, ao acesso à universidade, sem que este fator: "ser negro" ou “pardo” ou “indígena”, seja o motivo pelo qual não têm acesso ao ensino universitário, quando na verdade sabemos que é o fator impeditivo é a falência do ensino público médio e fundamental.
Quanto ao requisito necessidade, essa análise deve enfrentar a seguinte questão: comparativamente a outros meios de "democratização racial do ensino", a norma que privilegia vagas universitárias ao auto-declarado "negro" ou “índio” é o melhor meio para que parte da população, que antes não tinha acesso ao ensino, agora o tenha? A resposta parece negativa.
O melhor meio para fomentar a não-discriminação é a criação de mais vagas e a melhoria da qualidade do ensino a todos aqueles que desejem o ensino universitário, e não somente a aqueles, exclusivamente por terem nascidos com características físicas inerentes as suas raças.
Quanto ao requisito de proporcionalidade em sentido estrito, a análise deve enfrentar a seguinte questão: a limitação do número de vagas a candidatos "não-negros", “não-pardos” e “não-indígenas” em favor dos "negros" “pardos” e “indígenas” é condizente com a idéia de assegurar o direito fundamental de acesso ao ensino universitário em igualdade de condições?
A análise do projeto de lei aprovado pela Câmara não atende ao requisito de proporcionalidade em sentido estrito, porque a reserva de vagas aos auto-denominados pertencentes aquelas raças, implica na diminuição da oferta geral de vagas no ensino público gratuito e subtrai, com isso, direito subjetivo e fundamental dos demais que, em princípio, têm capacidade e habilitação para cursar o estudo universitário.
O fator de discrímen, para não ser arbitrário e, portanto, inconstitucional, deve se pertinente, guardar relação de causa e efeito, ser determinante, explicitar o motivo por que se considera aquele grupo ou categoria inferior ou digno de tutela especial. E diga-se o óbvio: ser negro, índio ou pardo não é o motivo determinante - por si só - de inferioridade intelectual, pois admitir o contrário é mais do que discriminatório, é estigmatizante.
Outro aspecto que merece destaque é a impossibilidade da identificação racial num país em que a sociedade é fruto da miscigenação européia, africana e indígena. Eugêne Schreider, especialista em antropologia física da Universidade de Paris, em artigo intitulado "Liaison anthropométriques dans l'espèce humaine", é peremptório em afirmar que o diagnóstico fundado na morfologia e constituição corporal não autoriza a identificação de raça.
Um equívoco que se tem cometido é o de considerar a ação afirmativa como sinônimo de política de cotas. A ação afirmativa (também chamada “discriminação inversa”),é medida extrema, que busca eliminar desequilíbrios entre grupos sociais, como forma de concretizar a igualdade entre eles. A fixação de cotas raciais é apenas uma das alternativas para se tentar superar a desigualdade, embora não seja, a melhor. Outras formas de ação podem ser sugeridas, como a fixação de metas para o acesso da população menos assistida à Universidade, alicerçada em políticas de base que garantam ensino fundamental e médio de qualidade para a população pobre.
Não devemos fomentar o que já fora por bastante superado. O mundo já mostrou fortes sinais de superação do preconceito racial, por exemplo, com a recente eleição norte-americana. Se queremos progredir, não devemos repetir a história, mas fazer uma história nova.
O referido debate traz à lembrança o famoso caso Bakke, levado a julgamento na Suprema Corte dos Estados Unidos em 1978 (Regents of the University of California vs. Bakke), em que afirmou ser inconstitucional o sistema de cotas, pois violava a “cláusula de igual proteção”, da 14a Emenda Constitucional, bem como a Declaração de Direitos Civis, pela qual ninguém pode ser excluído de programa ou benefício governamental por causa de sua raça ou cor.
O primeiro aspecto que merece atenção é a observância à proporcionalidade e a razoabilidade do fator de discrímen, ou seja, verificar se a reserva de vagas para determinados grupos étnicos – raciais apresenta-se de forma adequada, necessária e proporcional.
Para isso, cumpre indagar se a política de cotas raciais é adequada para fomentar o objetivo de não-discriminação no acesso de estudantes pardos, negros e indígenas. Aqui, a título de perseguir o objetivo não-discriminatório, em realidade, a norma discrimina estes estudantes, por pertencerem aos referidos grupos étnicos que concorrem em igualdade de condições, sob o critério de mérito, ao acesso à universidade, sem que este fator: "ser negro" ou “pardo” ou “indígena”, seja o motivo pelo qual não têm acesso ao ensino universitário, quando na verdade sabemos que é o fator impeditivo é a falência do ensino público médio e fundamental.
Quanto ao requisito necessidade, essa análise deve enfrentar a seguinte questão: comparativamente a outros meios de "democratização racial do ensino", a norma que privilegia vagas universitárias ao auto-declarado "negro" ou “índio” é o melhor meio para que parte da população, que antes não tinha acesso ao ensino, agora o tenha? A resposta parece negativa.
O melhor meio para fomentar a não-discriminação é a criação de mais vagas e a melhoria da qualidade do ensino a todos aqueles que desejem o ensino universitário, e não somente a aqueles, exclusivamente por terem nascidos com características físicas inerentes as suas raças.
Quanto ao requisito de proporcionalidade em sentido estrito, a análise deve enfrentar a seguinte questão: a limitação do número de vagas a candidatos "não-negros", “não-pardos” e “não-indígenas” em favor dos "negros" “pardos” e “indígenas” é condizente com a idéia de assegurar o direito fundamental de acesso ao ensino universitário em igualdade de condições?
A análise do projeto de lei aprovado pela Câmara não atende ao requisito de proporcionalidade em sentido estrito, porque a reserva de vagas aos auto-denominados pertencentes aquelas raças, implica na diminuição da oferta geral de vagas no ensino público gratuito e subtrai, com isso, direito subjetivo e fundamental dos demais que, em princípio, têm capacidade e habilitação para cursar o estudo universitário.
O fator de discrímen, para não ser arbitrário e, portanto, inconstitucional, deve se pertinente, guardar relação de causa e efeito, ser determinante, explicitar o motivo por que se considera aquele grupo ou categoria inferior ou digno de tutela especial. E diga-se o óbvio: ser negro, índio ou pardo não é o motivo determinante - por si só - de inferioridade intelectual, pois admitir o contrário é mais do que discriminatório, é estigmatizante.
Outro aspecto que merece destaque é a impossibilidade da identificação racial num país em que a sociedade é fruto da miscigenação européia, africana e indígena. Eugêne Schreider, especialista em antropologia física da Universidade de Paris, em artigo intitulado "Liaison anthropométriques dans l'espèce humaine", é peremptório em afirmar que o diagnóstico fundado na morfologia e constituição corporal não autoriza a identificação de raça.
Um equívoco que se tem cometido é o de considerar a ação afirmativa como sinônimo de política de cotas. A ação afirmativa (também chamada “discriminação inversa”),é medida extrema, que busca eliminar desequilíbrios entre grupos sociais, como forma de concretizar a igualdade entre eles. A fixação de cotas raciais é apenas uma das alternativas para se tentar superar a desigualdade, embora não seja, a melhor. Outras formas de ação podem ser sugeridas, como a fixação de metas para o acesso da população menos assistida à Universidade, alicerçada em políticas de base que garantam ensino fundamental e médio de qualidade para a população pobre.
Não devemos fomentar o que já fora por bastante superado. O mundo já mostrou fortes sinais de superação do preconceito racial, por exemplo, com a recente eleição norte-americana. Se queremos progredir, não devemos repetir a história, mas fazer uma história nova.